IA e Emoção: Como o Varejo Brasileiro Está Reescrevendo as Regras do Jogo

Enquanto o mundo discute os impactos da inteligência artificial (IA) no futuro do trabalho, o varejo brasileiro já está no laboratório, testando como dados e algoritmos podem ser aliados na construção de experiências emocionais que impulsionam vendas. Esse foi o tema central do último dia do Web Summit Rio, que reuniu Fabio Faccio (CEO da Renner), Flávia Barros (CMO da Leroy Merlin) e Victor Popper (CEO da Loja Integrada).

A Revolução dos Dados: Do Tamanho P ao Sentimento do Cliente

Fabio Faccio, à frente de uma das maiores redes de moda do país, trouxe um insight crucial: "Não basta analisar o comportamento do consumidor; é preciso decifrar a linguagem dos produtos". Na Renner, a IA não só prevê tendências de cores e cortes, mas também otimiza estoques considerando as nuances de cada item — como variações de tamanho (do P ao GG) e combinações de tonalidades.

Os números comprovam a urgência desse movimento. Segundo a McKinsey, empresas que usam IA para gestão de estoque reduzem custos operacionais em até 35% e aumentam a precisão de entregas em 50%. No caso da moda, onde 30% dos produtos são devolvidos devido a problemas de tamanho (dados da Retail Dive), a IA já é uma ferramenta crítica para minimizar perdas.

Mas Faccio vai além: "A IA não é só sobre eficiência; é sobre criar conexões". Ele citou casos em que algoritmos identificaram padrões de compra de clientes que sequer sabiam que gostavam de certos estilos, levando a coleções personalizadas que aumentaram a taxa de conversão em 18% em lojas piloto.

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Psicologia do Consumidor 2.0: Quando Dados e Emoção Colaboram

Flávia Barros, da Leroy Merlin, trouxe um contraponto fundamental: "Nenhum algoritmo substitui a capacidade humana de entender desejos invisíveis". A executiva revelou que 68% dos clientes da marca associam reformas em casa a uma sensação de "progresso pessoal" — um dado qualitativo extraído de pesquisas de comportamento, não de métricas frias.

A Leroy Merlin está usando IA para mapear emoções em tempo real. Em parceria com startups de neurociência, a empresa testa ferramentas que analisam expressões faciais de clientes em lojas físicas, cruzando essas reações com dados de compras online. O resultado? Campanhas como "Sua Casa, Sua História", que aumentaram o engajamento em redes sociais em 40% ao vincular produtos a narrativas emocionais de transformação.

Barros ressaltou, porém, que a tecnologia deve servir à estratégia, não ao contrário: "Um chatbot pode resolver 80% das dúvidas técnicas, mas os 20% restantes exigem um atendente que entenda o desespero de quem teve um vazamento às 22h de um domingo".

A Geração Z Está Ditando as Regras: "Seja um Psicopata de IA"

 

Victor Popper, da Loja Integrada, deu um tom provocativo ao debate. Ao relatar que sua filha de 12 anos criou um post para as redes sociais da empresa usando IA — com resultados 30% melhores que os da equipe de marketing —, ele disparou: "Quem não abraçar a IA hoje será enterrado por quem abraçar".

 

Popper defendeu uma abordagem quase radical: "Todo mundo tem que ser um psicopata de IA ou ter um na equipe". A provocação esconde uma verdade incômoda: enquanto 74% das empresas brasileiras ainda estão em fase experimental com IA (dados da ABComm), startups ágeis e gigantes como a Amazon já usam algoritmos para prever demandas sazonais com 95% de precisão.

 

A Loja Integrada, que fornece soluções para e-commerces, está implementando ferramentas de IA generativa para criar descrições de produtos automaticamente — reduzindo o tempo de cadastro em 70% e aumentando a relevância em mecanismos de busca. "É como ter um redator profissional trabalhando 24/7, sem folga ou custo adicional", brincou Popper.

 

Os três executivos concordaram em dois pontos cruciais:

 

A IA está em estágio embrionário, mas sua adoção não pode esperar. Enquanto o mercado global de IA no varejo deve atingir US$ 23,6 bilhões até 2027 (projeção da MarketsandMarkets), empresas que postergarem a implementação perderão competitividade.

 

Dados só têm valor quando contextualizados. Flávia Barros lembrou que, durante a pandemia, a Leroy Merlin identificou um pico incomum na venda de tinta branca. A IA sinalizou o padrão, mas foram humanos que descobriram o motivo: clientes em home office buscavam ambientes mais claros para reuniões virtuais.

 

O Caminho Para o Varejo do Futuro: Case Sephora e Lições Globais

 

Enquanto o painel focou em cases nacionais, experiências globais reforçam a tese. A Sephora usa IA para seu "Color IQ", sistema que analisa 70 tonalidades de pele para recomendar bases personalizadas — aumentando em 35% a satisfação do cliente. Já a Stitch Fix, dos EUA, combina algoritmos com curadoria humana para enviar caixas de roupas sob medida, reduzindo devoluções em 25%.

No Brasil, o desafio é escalar essas iniciativas em um mercado onde apenas 45% das empresas têm estratégias claras de transformação digital (segundo a FGV). A saída, como sugeriu Popper, é "experimentar em pequena escala, errar rápido e escalar o que funciona".

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Conclusão: A Receita Para o Varejo Vencer na Era da IA

 

O futuro do varejo não será disputado entre humanos e máquinas, mas entre empresas que souberem integrar ambos. A fórmula discutida no Web Summit Rio tem três ingredientes:

 

  • Dados hipercontextualizados (não apenas "o que" o cliente compra, mas "por que" e "como" ele se sente);

 

  • Agilidade para adotar ferramentas de IA sem medo de substituir processos ultrapassados;

 

  • Humanização como diferencial — afinal, como resumiu Flávia Barros: "Uma promoção de 50% é matemática; fazer o cliente chorar de emoção ao reformar a casa é arte".

 

No final, a lição é clara: no varejo do século XXI, empatia e algoritmos não são rivais. São parceiros de negócios.

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